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O advogado e os honorários sucumbenciais no Novo CPC

1. Introdução
O tema dos honorários sucumbenciais recebeu atenção especial no novo CPC (Lei nº 13.105/2015), que se ocupou do tema primordialmente em seus arts. 85 a 90, além de outras diversas menções ao longo do corpo do texto. Destaca-se em particular o primeiro desses dispositivos (art. 85) composto de nada menos que 19 parágrafos. Já numa primeira vista salta aos olhos que a disciplina é muito mais minudente do que aquela reservada ao assunto pelos arts.20 a 26 do CPC de 1973 (Lei nº 5.869/73). Em parte isso se deve ao fato de o novel codex ter incorporado regras que, antes, se achavam espalhadas em legislação extravagante. Um primeiro exemplo se acha no art. 85, §7º, que reproduz (com redação mais apurada) o disposto no art. 1º-D da Lei nº 9.494/97 (dispondo sobre o descabimento de honorários específicos relativamente no cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública em que não haja impugnação). Um segundo se exemplo se encontra no art. 85, §14, do novo CPC o qual reitera o comando do art. 24 da Lei n. 8;906/94 (o “Estatuto da Advocacia”) no sentido de que os honorários constituem crédito privilegiado na falência, concordata, concurso de credores, insolvência civil e liquidação extrajudicial, embora aperfeiçoando o comando ao equiparar os honorários aos “créditos oriundos da legislação do trabalho”.
Deixando de lado aquilo em que o CPC de 2015 se limitou a reproduzir o que já consta do CPC de 1973 e de outras leis, convém centrar atenções, sem preocupação de seguir a ordem em que os dispositivos figuram no diploma, sobre o que há de novidades, que podem ser divididas em alguns grupos.
Primeiramente, convém analisar alguns dispositivos inseridos no texto legal e que se limitam a positivar entendimentos já sedimentados pelos nossos tribunais.
Num segundo grupo (o mais extenso deles) se encontram os dispositivos em que houve efetiva inovação, rompendo-se com a sistemática positivada no CPC de 1973 e/ou com a jurisprudência firmada nos tribunais brasileiros.
Por fim, importa destacar os pontos que geram polêmica sob o império do CPC de 1973 e que não foram enfrentadas pelo novo Código, a ensejar a necessária reflexão por parte da doutrina e dos tribunais.
2. Positivação, pelo CPC/15, de entendimentos já consagrados nos tribunais à luz do CPC/73
Três são os exemplos de dispositivos do CPC/15 que consagram posições firmadas há tempos pelos tribunais:
a. Regra da causalidade – À luz do caput do art. 20 do CPC/73, infere-se que a parte sucumbente (rectius, vencida), ao menos em regra, será condenada ao pagamento de honorários ao advogado da parte vencedora, assim como ao reembolso das custas e despesas por ela incorridas. Contudo, mirando o exemplo de ordenamentos estrangeiros, a doutrina e, principalmente, os tribunais há muito reconhecem que a fixação da responsabilidade pelo pagamento dessas verbas baseado exclusivamente na sucumbência pode se mostrar muitas vezes injusto. Daí porque ele há de ser afastado sempre que a parte sucumbiu por ato atribuível ao seu adversário. É a chamada “regra da causalidade”. O exemplo típico é da chamada “perda de objeto do processo” (rectius, falta superveniente de interesse processual do autor) decorrente de ato praticado pelo réu. Pois o art. 85, §10, do CPC/15 positiva esse entendimento de modo a excluir qualquer dúvida a respeito.
b. Honorários em cumprimento de sentença – Da mesma forma, os arts. 85, §1º, 523, §1º, fazem eco ao entendimento assentado no STJ em sede de recursos especiais repetitivos (REsp 1134186/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 01/08/2011) para o fim de reconhecer o cabimento de honorários advocatícios em sede de execução definitiva de título judicial, caso não haja o cumprimento espontâneo por parte do executado, fixados no percentual de 10%.
c. Honorários sucumbenciais cobrados por sociedade de advogados – O art. 85, §15, igualmente consagra o entendimento do STJ (v.g. no AgRg no REsp 1002817/PR, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 16/12/2008) de que os honorários sucumbenciais podem ser cobrados pela sociedade de advogados a que pertence o patrono credor.
3. Diversas alterações promovidas pelo CPC/15 em relação ao CPC/73 e aos entendimentos jurisprudenciais sob sua vigência cristalizados
As alterações são tão numerosas que convém catalogá-las sinteticamente em itens:
a. Drástica redução da “apreciação equitativa do juiz” – O §3º e o §4º do art. 20 do CPC/73 estabelecem regras distintas para fixação da verba honorária sucumbencial, baseando-se num único critério: a existência ou não de condenação para pagamento de quantia certa em dinheiro. No primeiro caso (regulado pelo §3º), os honorários “serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação”. As únicas exceções de sentença condenatória que não se submetiam a essa regra eram aquelas proferidas em “causas de pequeno valor” (casos em que o juiz pode arbitrar honorários superiores a 20% da condenação e até mesmo superiores ao valor da causa) ou contra a Fazenda Pública (casos em que o juiz devia evitar o máximo de 20% e pode eventualmente arbitrar valor inferior a 10%). Nessas duas situações, e em todos os numerosos casos em que não há condenação – sentença terminativa, de improcedência, de procedência de pedido de caráter declaratório ou constitutivo, na sentença que impõe obrigação de fazer, não-fazer e dar coisa diversa de dinheiro, e nas execuções embargadas ou não – o §4º do art. 20 do CPC autorizava o juiz a fixar verba honorária sem ter em conta os parâmetros indicados pelo §3º, por “apreciação eqüitativa do juiz”, considerando-se os critérios das alíneas “a” a “c” do §3º. Essa lógica é profundamente alterada pelo CPC/15, cujo art. 85, §2º, determina expressamente que os honorários sejam fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa”. Contudo, persistem as ressalvas de aplicação desses percentuais em face da Fazenda Pública (art. 85, §3º, adiante comentado) e nas “em que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito baixo”, hipótese em que persiste a apreciação equitativa (art. 85, §8º).
b. Honorários sucumbenciais em face da Fazenda Pública – Historicamente, o art. 20, §4º, do CPC/73 deu margem para que o juiz, à guisa de fazer “apreciação equitativa”, aviltasse os honorários sucumbenciais devidos à parte que venceu a Fazenda Pública. Sensível a isso, o art. 85, §3º, dispôs critérios objetivos para que o juiz condene o Poder Público à verba sucumbencial, baseados no valor da condenação, proveito patrimonial ou causa. Na maioria dos processos – que envolverem até 200 salários-mínimos – os percentuais mínimo e máximo serão os mesmos que aqueles aplicados nos litígios ente particulares. Nos casos em que o processo discutir valores superiores, os incisos II a V estabelecem uma escala que varia de 8% a 10% sobre o valor da condenação ou do proveito econômico obtido acima de 200 e abaixo de 2.000 salários-mínimos, 5% a 8% entre 2.000 e 20.000 salários, 3% a 5% entre 20.000 e 100.000 e 1% a 3% acima de 100.000. As faixas são cumulativas, de modo que se “a condenação contra a Fazenda Pública ou o benefício econômico obtido pelo vencedor ou o valor da causa for superior ao valor previsto no inciso I do § 3o, a fixação do percentual de honorários deve observar a faixa inicial e, naquilo que a exceder, a faixa subsequente, e assim sucessivamente” (art. 85, §5º). O §4º do mesmo dispositivo cuida de resolver outras questões relativas à aplicação dessa escala;
c. Honorários sucumbenciais em grau recursal – O art. 20, §1º, do CPC/73 determinava que, ao julgar o recurso e o “incidente”, a autoridade jurisdicional devia ater-se a condenar o vencido ao pagamento das despesas processuais. A contrario sensu, o dispositivo excluía a condenação do vencido no recurso e no incidente processual ao pagamento de honorários ao advogado do vencedor. Ao menos no tocante ao recurso, o CPC/15 inovou. O art. 85, §1º, dispõem expressamente que são devidos honorários “nos recursos interpostos, cumulativamente”, desde que o cômputo geral dos honorários arbitrados em 1º grau e em sede recursal não ultrapasse 20% (§11). Para tanto, deverá o juiz “majorar” a verba que houver sido fixada na decisão recorrida, o que naturalmente limita o cabimento dessa nova disposição à apelação e ao agravo de instrumento contra decisões que fixam honorários sucumbenciais, como a que julga parcialmente o mérito (art. 355) ou excluem litisconsórcio, por exemplo. Ou seja, os honorários sucumbenciais não vão se aplicar a todos os recursos, mas sim àqueles que atacarem decisões que tenham fixado honorários. Quando improvido o recurso, o tribunal há de aumentar a condenação imposta ao vencido em 1º grau (desde que observado o limite aqui referido); quando provido, não bastará “inverter” a responsabilidade pelas verbas sucumbenciais, sendo necessário remunerar o advogado da parte vencedora pelo trabalho adicional desenvolvido na fase recursal (respeitando-se, repita-se, o limite máximo de 20%). A norma pode funcionar como um saudável mecanismo de desestímulo ao recurso temerário.
d. Inexistência de compensação de honorários em caso de sucumbência recíproca – o art. 21 do CPC/73 dispunha que em caso de sucumbência recíproca, a responsabilidade pelo custo do processo seria repartida, com a compensação relativamente a honorários e despesas. A norma fazia sentido ao tempo em que foi editada, pois à época os honorários revertiam à parte. Contudo, face ao art. 23 da Lei n. 8.906/94 – que atribui ao advogado o direito a perceber os honorários de sucumbência – o dispositivo se tornou anacrônico, por impor compensação entre créditos e débitos com credores e devedores distintos (verba devida pelo réu ao advogado do autor com verba devida pelo autor ao advogado do réu), em franca violação ao art. 368 do CC. Já o STJ, que deveria ter considerado o art. 21 do CPC/73 parcialmente derrogado pelo CPC/15, compactuou com a ilegalidade ao editar o enunciado nº 306 de sua súmula (“Os honorários advocatícios devem ser compensados quando houver sucumbência recíproca, assegurado o direito autônomo do advogado à execução do saldo sem excluir a legitimidade da própria parte”). O CPC/15 finalmente corrige tal distorção, dispondo que não há compensação (art. 85, §14, in fine), de modo a permitir que cada advogado execute a verba que for fixada pela parcela da vitória que obtiveram em favor de seus respectivos constituintes;
e. Juros moratórios – Sob o império do CPC/73, o STJ tinha julgados reconhecendo que o termo inicial dos juros moratórios seria a citação. Já o art. 85, §16, do CPC/15 dispõe que, ao menos nos casos em que os honorários forem fixados em quantia certa (e não em percentual sobre alguma das bases de cláusula previstas no §2º), os juros fluirão apenas após o trânsito em julgado da decisão que os impuser. Trata-se de uma solução injustificável.
f. Prestação vincendas – Também se alterou a base de cálculo dos honorários sucumbenciais nos casos em que a condenação inclui prestação vincendas nos casos de “indenização por ato ilícito contra pessoa”. O art. 20, §5º, do CPC/73, determinava que dos honorários incidiam sobre “a soma das prestações vencidas com o capital necessário a produzir a renda correspondente às prestações vincendas”. Já o art. 85, §9º, do CPC/15 dispõe que se incluem na base de cálculo da verba honorária as prestações vencidas e 12 vincendas. Ambos os Códigos silenciam quanto a outras hipóteses de condenação a prestação vincendas que não decorrentes de ilícito pessoal. Na vigência do CPC/73 o STJ sinalizou o descabimento da inclusão de parcelas vincendas na base de cálculo dos honorários em “ações previdenciárias” (Súmula nº 111 do STJ). Contudo, parece razoável sustentar o entendimento de que a inclusão das 12 parcelas vincendas na base de cálculo dos honorários alinha-se ao entendimento de que elas são computadas na composição do valor da causa independentemente de se tratar de hipótese de ilícito contra a pessoa.
g. Decisão omissa quanto a honorários sucumbenciais e ação autônoma – O art. 85, §18, do CPC/15 permite que o advogado cobre por ação autônoma a verba honorária que deixou de ser fixada em decisão favorável ao seu constituinte e transitada em julgado, revogando, nesse particular, o verbete n. 453 da súmula do STJ,
h. Execução provisória – O art. 520, §2º do CPC/15 sepulta o entendimento do STJ, à luz do CPC/73 de descabimento de honorários sucumbenciais em execução provisória (REsp 1291736/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 20/11/2013)
4. Polêmicas existentes à luz do CPC/73 e que subsistirão à luz do CPC/15
Por derradeiro, é de rigor destacar os pontos de dúvida existentes à luz do CPC/73 e não foram solucionados pelo CPC/15:
a. Honorários na impugnação ao cumprimento de sentença – O CPC/73 não esclarece sobre o cabimento ou não de fixação de verba honorária relativa exclusivamente ao julgamento da impugnação ao cumprimento de sentença. O STJ limitou-se a afirmar quanto ao descabimento no caso de rejeição da impugnação (REsp 1134186/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial, julgado em 01/08/2011), silenciando quanto à hipótese de acolhimento. O CPC/15 poderia ter resolvido a questão, mas se omitiu. Entende-se razoável defender, numa interpretação extensiva do art. 85, §14º, que a verba seria, sim, cabível, seja no caso de rejeição, seja de acolhimento da impugnação;
b. Honorários na liquidação de sentença – À luz do CPC/73 a jurisprudência do STJ era vacilante em reconhecer o cabimento de honorários quando do julgamento da liquidação, tendendo a afirmar o cabimento na liquidação “por artigos” e o descabimento na liquidação “por arbitramento”. O CPC/15 silenciou a respeito, salvo no tocante à hipótese de liquidação em face da Fazenda Pública (pois o art. 85, §4º, II, do CPC/15 parece sugerir uma única fixação de honorários pela “fase” de conhecimento e pela “fase” de liquidação). Desponta mais equilibrado reconhecer a necessidade de fixar nova e diferente verba se a liquidação assumiu caráter contencioso e se pode detectar uma parte vencedora e uma vencida, devendo o percentual ser fixado pelo juiz sobre a diferença entre as pretensões dos litigantes.

Heitor Vitor Mendonça Sica
Doutor, mestre e bacharel em Direito Processual pela Universidade de São Paulo. Especialista em Direito da Economia e da Empresa pela Fundação Getúlio Vargas. Professor. Advogado.

Fonte: Genjurídico.com.br

foto pixabay

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